O Brasil ainda se encontra numa posição excessivamente dependente nessa área.
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Chamou a atenção há alguns dias o fato de que o Brasil está participando do exercício “Locked Shields”, o principal exercício de defesa cibernética do Ocidente e que se dá no contexto do Centro de Excelência em Defesa Cibernética.
São 41 países participando do exercício, mas o Brasil é o único representante da América Ibérica nele. Nem países notoriamente próximos dos EUA e da OTAN, como Colômbia e Equador, tampouco um país tão alinhado aos EUA por motivos de simpatia pessoal, como a Argentina de Milei, foram convidados para participar.
De um modo geral, a finalidade do treinamento seria testar respostas conjuntas a ataques digitais em larga escala através de simulações em cenários reais.
Não obstante, há uma série de incongruências que tornam duvidoso que a participação nesses exercícios esteja em linha com nosso interesse nacional.
Em primeiro lugar, o acordo para a participação do Brasil neste exercício foi firmado no governo Bolsonaro, mas aparentemente o governo Lula não teve vontade política ou interesse de romper com o mesmo, o que é uma pena.
Em segundo lugar, na prática, o Brasil ainda não tem qualquer sistema de defesa cibernética abrangente. O Comando de Defesa Cibernética, criado há não muito tempo, foi pensado originalmente para este fim, mas acabou sendo reduzido exclusivamente à defesa dos sistemas do próprio Exército Brasileiro. Nesse sentido, na ausência de uma própria defesa cibernética geral, o que o Brasil poderia tirar de benefício da participação nesses exercícios? Muito pouco.
A integração nas estruturas de ciberguerra da OTAN provavelmente levará o Brasil a adquirir seus sistemas, adotar suas doutrinas e solicitar seus especialistas para fins de treinamento das nossas próprias hipotéticas forças cibernéticas futuras. Isso, evidentemente, gerará um nível de dependência de nossas forças que não se alinha bem com os desafios futuros e interesses estratégicos do Brasil.
Observe-se, por exemplo, que segundo o relatório Cyberattacks Targeting Latin America da F5Labs, a principal fonte de ataques cibernéticos contra a América Ibérica são os EUA. Em segundo lugar vem a Lituânia, também membro da OTAN, e situada na mesma região báltica em que estão sediadas as estruturas de ciberguerra do Centro de Excelência em Defesa Cibernética Colaborativa da OTAN.
Ademais, no que concerne o interesse brasileiro em confiar nos países da OTAN para questões de defesa cibernética, é necessário levar em consideração o fato de que o Brasil está acostumado a utilizar hardware e software (incluindo sistema operacional) da Big Tech dos EUA para todos os fins – inclusive nas instituições do Estado.
O problema aí é que como já foi demonstrado e explicitado reiteradamente, todos os produtos Windows já vêm com “backdoors” que facilitam o acesso dos sistemas em questão pela NSA, a agência de inteligência e segurança internas dos EUA.
A implicação aí é de que atrelar a nossa cibersegurança às estratégias e sistemas da OTAN vai, na realidade, reduzir a nossa cibersegurança pelo próprio fato da fragilidade intencional dos hardwares e softwares comumente usados por países aliados do Ocidente e pela práxis notória, por parte dos EUA, de espionar os seus países aliados.
Fora das Forças Armadas, a Polícia Federal brasileira também possui a sua estratégia cibernética centrada na tecnologia estrangeira, especificamente de Israel, com softwares como o Cellebrite Premium. Nos últimos anos, é precisamente a Polícia Federal que tem sido uma das principais ferramentas de influência da CIA e do Mossad no Brasil, e não se pode excluir que o uso de softwares israelenses torne o país frágil diante da própria possibilidade de espionagem israelense. Importante recordar que o Brasil já foi espionado no passado por Israel, bem como foi alvo de um assassinato de um importante cientista nuclear por agentes israelenses.
Para que se entenda aí o problema ressalte-se que o caso não é isolado. Em março, o Comando de Defesa Cibernética participou no Defence Cyber Marvel 4, coordenado pelo Reino Unido e que contou com participação da Ucrânia. E em outubro de 2024, o Brasil organizou o exercício Guardião Cibernético 6.0, também contando basicamente com a participação de países da OTAN.
Considerando a importância da ciberguerra na era da guerra híbrida, aquilo que percebemos é que o Brasil ainda se encontra numa posição excessivamente dependente nessa área.